Exposições

Cultivos do Mistério

“Opacidades podem coexistir, confluir, tramando os tecidos cuja verdadeira compreensão levaria a textura de certa trama e não à natureza dos componentes”

Edouard Glissant, Pela Opacidade em Poética da Relação, p. 53

Oficina Solar é a realização de um sonho coletivo, a primeira edição da residência artística e de pesquisa do Solar dos Abacaxis. Durante o período de três meses recebemos artistas de diversas regiões do Brasil e do mundo para desenvolverem suas práticas na nossa sede. As artistas foram selecionadas a partir de chamada aberta ou por convites diretos relacionados a parcerias institucionais.

Recebemos propostas que derivam sobre temas tão amplos quanto o desejo de implementar uma escuta para as nuvens, fazer a terra se mover, se relacionar com astrologia, alquimia, candomblé e desenho, pensar sobre as histórias de um passado coletivo através dos cabelos, saber o que é sentir uma viagem, perguntar-se como são exatamente nossas ruínas ou o que aconteceria aos colonos se os astros se tornassem opacos como a minha memória?

Habitamos essas perguntas, proposições e dúvidas em atividades constantes, visitas, encontros e trocas. O que apresentamos em formato expositivo é a continuação da prática do ateliê, sem pretensões de uma formalização final mas em contínua movimentação. Esta exposição é um experimento, a apresentação de um processo ainda em construção.

Ao realizar uma exposição, novas formas de ver o trabalho se apresentam, se abrem para o público e para quem produz, novas ficções surgem para construir a compreensão do todo. Uma questão constante nas práticas das artistas tem sido a busca pela opacidade, os embates sensoriais, a tradição como tecnologia, as relações interplanetárias, a compreensão dos seres metabólicos e inertes, as pequenas cosmogonias, as impermanências, a voz da água e a formação de novos corpos. O mistério, o desconhecido, os rastros e a memória guiaram essa exposição.

O escritor e poeta da Martinica, Edouard Glissant,  nos orienta em pensamento ao trazer o conceito de direito à opacidade, quando nos relata que “o pensamento da opacidade me resguarda das vias unívocas e das escolhas irreversíveis.” Aprendemos assim a conviver, habitar o dissenso, perder os contornos, sem a necessidade de um aprisionamento identitário ou unidade.

Optamos pela partilha ao ocupar ambos os espaços expositivos da sede com uma proposta que acolhe os desejos de cada artista e a maneira como desejam se relacionar com a arquitetura do espaço. Sem limites ou contornos pré estabelecidos. Recusando a bússola para buscar outras orientações no mundo. Abrimos as portas para que os processos sejam também compartilhados.

Essa mostra também celebra os 8 anos do Solar e a relação da instituição devota à Oxum, ela se faz presente aqui por meio das sabedorias ocultas, das mães ancestrais, do cheiro de alfazema e das formas de habitar mistérios.

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